O Portal AZ teve
acesso a documentos que mostram que o Ministério Público do Estado do Piauí
instaurou procedimento investigatório contra o governo de Rafael Fonteles (PT)
para apurar a contratação direta de mais de 30 mil servidores sem concurso
público entre janeiro de 2023 e dezembro de 2024. A suspeita é de que essas
admissões, classificadas como “contratados” ou “prestadores de serviço”,
estejam sendo utilizadas em larga escala para burlar a exigência constitucional
de ingresso por concurso e inflar artificialmente a folha de pessoal.
Segundo dados
encaminhados pelo Sindicato dos Agentes de Tributos da Fazenda Estadual
(Sinatfisco), houve um aumento de 340% nos gastos com terceirizados desde o
início da gestão Fonteles. Os números são robustos: de um total de 133.795 CPFs
cadastrados na folha de pagamento estadual em dezembro de 2024, 42.546 estão na
condição de contratados ou prestadores, patamar que praticamente empata com o
de servidores efetivos (42.876).
Em janeiro de 2023,
início da atual gestão, o número de contratados era de 12.650 — ou seja, o
governo teria admitido quase 30 mil pessoas em menos de dois anos sem concurso.
A despesa com esse tipo de vínculo disparou: em 2023, foram gastos R$ 239,2 milhões;
em 2024, o valor saltou para R$ 614,5 milhões, um acréscimo de R$ 375 milhões
em apenas um ano.
DESPACHO DE
INSTAURAÇÃO DE NOTÍCIA DE FATO
O promotor Francisco
de Jesus, da 42ª Promotoria de Justiça de Teresina, destacou no despacho que
tais contratações violam frontalmente o artigo 37 da Constituição Federal, que
exige concurso público como regra para ingresso no serviço público e impõe severas
restrições a cargos comissionados e contratações temporárias. “A Constituição é
intransigente quanto à obrigatoriedade do concurso. A exceção — contratação
temporária — exige necessidade extraordinária, prazo determinado e lei
específica, o que precisa ser cabalmente demonstrado”, afirma o texto.
O MP requisitou da
Secretaria de Administração do Estado (Sead-PI) e da Secretaria de Governo
(Segov-PI) esclarecimentos em até 15 dias úteis. Entre os pontos solicitados
estão: a lista detalhada dos contratados por órgão; justificativas do suposto
interesse público que teria motivado as admissões; explicações sobre a
categoria “contratado” e o motivo pelo qual o Portal da Transparência do Piauí
está há semanas fora do ar, impedindo a consulta pública aos dados de pessoal.
A investigação poderá
resultar na abertura de inquérito civil e eventual ação por improbidade
administrativa, caso se confirme o uso abusivo das contratações para funções
permanentes, sem justificativa legal e sem concurso — o que configuraria burla
direta ao princípio da impessoalidade e ao sistema de mérito da administração
pública.
Enquanto isso, os
concursos anunciados são escassos, com poucas vagas e longas tramitações.
O Sinatfisco ironiza:
“Fala-se muito em concurso, mas o que se faz mesmo é contratar sem ele”.
Há suspeitas de que o
promotor Chico de Jesus não atue mais no caso. Informa-se que ele teria sido
afastado por decisão unânime do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP),
no âmbito de um Processo Administrativo Disciplinar (PAD).
Fonte: Portal AZ